quarta-feira, 15 de junho de 2016

Um Olhar Menina de Maria da fé Mulher


Eu Me chamo Maria da Fé. Eu herdei o nome da minha mãe, Maria da fé, e é meu dever levar sua história e suas costuras para os filhos, e para os filhos dos nossos filhos e para os filhos dos filhos de nossos filhos.

Os fios desse novelo me fazem lembrar as histórias de minha mãe, muita lindas e boas de contar, mas uma nenhum puco fácil. Histórias que vivi há muito tempo. Histórias das mulheres da minha vida. Quando o fio enrosca assim, me lembro dela, e como ela contava das suas lembranças, enrolada por um fio que queimava, ela e um pedaço da sua vida que perdeu pra sempre. Os fios... Com os fios podemos construir coisas lindas, mas eles também podem servir pra nos controlar, nos oprimir... torturar. Ela remexia, gritava, e eu chorava para que libertassem a minha mãe! Ali, ela não era mais mulher, não era mais mãe, não era mais humana. Era só mais um chão a ser pisado pra satisfação deles. Mas eu tava ali. E ela encontrou o fio que nos unia. Teceu a coragem e a vida, não se permitiu ser destruída. As mulheres da minha vida me envolveram com muitos fios, que foram tecendo na minha frente. E eu só deslumbrava a força e o movimento de cada uma. A tortura abriu um buraco nela, mas iam encontrando coragens, ideias, novas histórias, que iam costurando dentro de si. O fio de uma passava por outra, que passava por outra, que passava por outra, deixando forte e resistente a costura de cada uma e a que unia todas elas. Pra sempre Maria da Fé!
Eu sou apenas uma menina!   Mas ela sempre dizia: Fé Menina!  Feminina.
Maria da fé, minha mãe era de verdade uma mulher de fé. Sua fé guiava nosso caminho e nossa vida. Teve fé na vida e na terra. Devota de Maria e Nossa Senhora aparecida, não saia de casa sem fazer uma oração. Era costureira, costurava as palavras os alimentos que preparava e bordava a educação de suas 3 filhas, Maria da Luz, Maria da graça e Maria da Fé, as chamava de três Marias. Todas as linhas já traçavam um novo sentido para o seu dia, até mesmo a linha do horizonte. Sempre lutou pelos seus direitos e criou a cooperativa das tecelãs. Lá elas costuravam tudo, costuravam até um dia quente nas noites de Inverno. Costuravam poesias... Minha mãe ouvia  o fio e a agulha, ela dizia que eram eles quem guiavam A costura, suas mãos eram apenas um instrumento da divina mãe.
Meu pai morreu, antes de eu completar 7 anos, era pescador. Morreu afogado em uma tempestade em um dia de pesca. Os pescadores conseguiram salvar o corpo. Era fim de tarde, o sol ainda não tinha se posto, minha mãe já sabia que alguma coisa havia acontecido... Todos seguravam o chapéu no peito  e a cabeça baixa. Foi a única vez em que eu vi minha mãe chorar. Des de então ela não parou de costurar, dizia que nunca faltaria  nada pra nós, se faltasse comida ela dizia que costurava um banquete pra gente comer. Quando a mãe falava do pai, dizia que eles eram como o fio e a agulha, ela era agulha e ele o fio, se entrelaçava em um linda dança de amor, um passando pelo outro, se manado, mas um dia, a mãe divina cortou o fio e eles tiveram que se separar. Mas dizia ela que é só por um tempo, porque quando o amor é de verdade é eterno... E assim crescemos, com nossa mãe transformando a dor em poesia. Com as linhas em sua mão, costurou o passado e o meu presente.  Uma  vez eu perguntei pra ela “Mãe, eu posso costurar as nossas sombras pra gente nunca se separar?” ela dizia que já estava costurado, mas por um fio invisível, que ela teceu logo quando cortaram o meu cordão umbilical. Ela não entedia por que aquele fio precisava ser cortado... Então rapidamente costurou outro. 
A musica que liga o nosso fio é essa:  

 “Mãezinha do céu, eu não sei rezar;
Eu só sei dizer: "Quero te amar"
Azul é teu manto, branco é teu véu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu

Mãezinha do céu, Mãe do puro amor,
Jesus é teu filho,
E eu também sou
Azul é teu manto, branco é teu véu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu

Mãezinha do céu, vou te consagrar
A minha inocência, guarda-a sem cessar.
Azul é teu manto, branco é teu véu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu

Mãezinha do céu, em tua proteção
Oh, guarda meus pais e a todos os meus irmãos!
Azul é teu manto, branco é teu véu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu

Mãezinha do céu, eu não sei rezar;
Eu só sei dizer: "Quero te amar"
Azul é teu manto, branco é teu véu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu
Mãezinha, eu quero te ver lá no céu”

A minha mãe, construiu a bandeira do Brasil e ela me disse que foi a nossa musica que inspirou ela pra tecer o manto azul na bandeira. Em homenagem a nossa senhora aparecida, para dar fé a todo o povo Brasileiro.

Sua morte foi triste, nesse dia, também morreu uma parte de mim.  O vento gelado soprava lá fora. Ela não podia mais tecer o meu sol. Enquanto o filho da puta segurava a bandeira do país
Para sempre Maria da fé. 

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